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O novo professor...

educação
Eduardo Lyra

deficiência auditiva

Falar com as mãos

Levar os surdos para a sala regular exige nova postura do professor, tato para lidar com o intérprete e, acredite, muitas explicações orais

A inclusão de crianças com deficiência auditiva sempre foi polêmica, mas recentemente ganhou um novo rumo em nosso país. De acordo com a política do governo federal, eles não devem mais ficar segregados nas escolas especiais e precisam estudar desde cedo em unidades comuns, com um intérprete que traduza todas as aulas para a Língua Brasileira de Sinais (Libras) e o contraturno preenchido por atividades específicas para surdos. Problema resolvido? Nem de longe. Enquanto entidades do setor ainda denunciam a falta de estrutura para a implementação das regras (leia o quadro na página 74), os docentes já começam a receber parte dessa nova clientela e estão criando formas próprias de trabalho - muitas com sucesso.

Não é uma tarefa fácil nem existe uma fórmula conceitualmente correta para lidar com a situação. Cada caso é um caso (saiba como pedir ajuda no quadro abaixo). A professora de Geografia Marilda Dutra, da EE Nossa Senhora da Conceição, em São José, na Grande Florianópolis, por exemplo, aprendeu uma lição curiosa logo nos primeiros dias de trabalho. Para ensinar quem não ouve, ela tem de falar mais. A maior mudança foi deixar o giz em segundo plano. Cada tipo de relevo, clima e vegetação precisava de fotografias, desenhos, gravuras e muitos exemplos verbais. Em vez de simples mapas, o mundo passou a ser representado em bolas de isopor para facilitar a compreensão dos meridianos.

Maria Inês Vieira, coordenadora do Programa de Acessibilidade da Divisão de Educação e Reabilitação dos Distúrbios da Comunicação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (Derdic-PUC), explica o motivo da necessidade de rever o uso do quadro-negro. "Mesmo que o surdo já saiba ler e escrever em português, ele demorará mais para entender orientações por escrito", diz. A especialista ensina que o ouvinte entende a sequência de palavras escritas porque tem uma cultura prévia oral. Já quem não ouve está sendo apresentado ao português como um todo e não conhece a organização da língua. "Os conjuntos de palavras podem não fazer sentido na maneira como ele aprendeu a pensar. É como traduzir apenas as palavras de um texto em alemão ou chinês. Não é o suficiente para a compreensão do todo", diz.

Em Florianópolis, a professora de Matemática Silvana Maria Soster teve outra reação no início do ano passado, quando foi informada pela direção da EM Luiz Cândido da Luz que uma de suas classes da 2ª fase do ciclo 2 (equivalente ao 5º ano, mas já com um docente por disciplina) teria quatro alunos surdos. "Tomei um susto. Nunca tinha passado por isso e pensei: será que posso?", conta. Para Roseli Baumel, educadora livre-docente especializada em Educação Especial da Universidade de São Paulo (USP), esse tipo de dúvida é natural. "Temos de ser honestos e admitir que não estamos prontos", orienta a especialista.

Recursos diferenciados para a turma heterogênea
Passado o receio inicial, Silvana percebeu com o tempo que quase tudo precisava ser adaptado: a postura, a maneira de falar, a avaliação e, principalmente, os materiais. "Uma pessoa que cresceu sem escutar aprende por observação. Ela precisa ver, montar e perceber os conceitos de forma concreta", diz Roseli. Foi assim, com aulas visuais e exemplos palpáveis, que conseguiu lecionar. Usou material emborrachado, quadrados, cubos, jogos, dados e desenhos. Ensinou adição com objetos que se agrupavam. Para a multiplicação, dividiu os próprios alunos da sala em quadrados desenhados no chão: três turmas de quatro igual a 12, cinco grupos de cinco crianças resultavam em 25.

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